Poderia fazer deste texto uma questão individual, desligando-me de qualquer movimento ou correntes ácratas e simultaneamente resguardar o meu ego dos eruditos da ação e dos que sacralizam o anarquismo, mas a verdadeira essência destas palavras encontra-se na necessidade de uma projeção, certamente não massiva, embora concreta, de levar às ruas a raiva caótica que sentimos.
Todxs estamos conscientes da nossa posição na estrutura social, da passividade pequeno burguesa até à radicalidade nihilista, podemos continuar a fazer análises sobre os métodos de controlo do capital e utilizá-los directamente como resposta para justificar a vitimização e a paz social, o limitarmos-nos a dizer que os indivíduxs que conformam a sociedade são na sua totalidade nossxs inimigxs, em ambos os casos a resposta em si mesma não faz mais do que nos confrontar com a nossa posição rebelde e desembaraçarmos-nos de qualquer ação que transcenda as nossas afinidades.
A partir destas palavras não se procura atacar nem as ações totalmente dedicadas à propagação, nem muito menos as individuais que pretendam atacar as estruturas do poder, mas sim, entendendo-me como parte de uma corrente mais ampla que a minha existência, tentar compreender e enfrentar o problema da falta de um posição anti-autoritária em guerra contra o poder, para além dos espaços auto-referenciais e das aparências virtuais.
A minha posição, basicamente, parte do fato de que, como movimento anarquista não constituímos uma força que possa ser uma ameaça real ao poder nas ruas, e eu posiciono-me em negação com a ideia geralizada de que o problema é puramente quantitativo.
Referirmos-nos à questão como meramente quantitativa isso significa negar, de antemão, a possibilidade de que um indivíduo haja, pelas suas próprias convicções, e possa ser realmente perigoso – e ao mesmo tempo continuar com a perspectiva social, na qual um sujeito revolucionário dotado da consciência emancipadora irá conceber a revolução quando se dêem certas condições.
Sabemos perfeitamente que existem inúmeras tendências anti-autoritárias, no território, e não creio que seja necessário um censo anárquico para determinar a nossa existência, mas quando a teorização se transforma numa representação nostálgica de lutas passadas ou na radicalidade estética, torna-se tristemente aborrecido o diálogo e, até mesmo, a nossa presença.
Cada um terá as suas razões, algumas mais do foro ideológico, e outras pessoais, o que é certo é que queremos a destruição de tudo o que nos oprime, mas não só em termos materiais, sabemos que as nossas projeções também procuram a ruptura do tecido social de dominação e nas ações que realizamos – mesmo aquelas em que concebemos a destruição de toda a sociedade, partem do seio das concepções sociais ou entre elas – atacamos na consciência de saber que existe um outro, em torno do qual procuramos que se confronte com o desejo rebelde; isto não significa que estamos em busca da sociedade, mas que estamos atravessados por um mundo simbólico do qual poderíamos assumir o comando, antes de ficarmos indiferentes perante o conflito e o espetáculo social.
Desta forma, eu não vou fazer um contraste entre o grupo de afinidade ou luta social, mas a transcendência de ambas as projeções, mesmo que para um fim ideal – chame-se revolução social ou por uma simples ideia de quebrar a paz social hoje, pelas nossas próprias convicções e fazer das nossas ideias uma ameaça que se expanda para além das nossas tarefas diárias.
Ora bem, creio que seria consequente concebê-lo. Por quê? em relação à nossa presença nos conflitos sociais, entendendo que, embora todxs gostaríamos de participar no caos em massa nas ruas, a distância para nos depararmos com esse panorama – não devido a fraqueza do nosso lado mas a um ambiente social pacificado por anos de assistencialismo democrático e à triste esquerda sempre amiga do poder – embora com exemplos de sobra de tensões sociais nos últimos anos em que não houve presença anti-autoritária generalizada – não é minha intenção entrar em uma autocrítica revisionista, mas para ver até ao presente próximo. Sabemos que os anos de bons maneiras governamentais e crescimento social estão a ir abaixo, o show progressista vai expôr massivamente a sua posição e a crise económica prejudicará os mesmos de sempre, contra esta realidade vindoura será nossa responsabilidade impulsionar o conflito – com as nossas perspectivas tanto sociais como anti-sociais – ou continuar a justificar o nosso afastamento, procurando as contradições já conhecidas e que fazem parte de todos os movimentos.
Por um Dezembro Negro,
A prática da insurreição nas ruas
Morte ao estado e que viva a anarquia
Indivíduo anti-autoritário.
em espanhol