No final de agosto, o chamado “Ministério da Saúde e Solidariedade Social” anunciou um corte de 50% no financiamento, previsto para 2011, destinado às estruturas de saúde mental do Programa da Reforma Psiquiátrica “Psychargos”. O restante 50% já foi distribuído, mas, em muitos casos, os funcionários dessas estruturas não recebem o salário há alguns meses já.
A decisão refere-se a 210 estruturas de saúde mental e de desinstitualização (pensões, albergues, apartamentos assistidos, centros de dia, etc), 3.050 funcionários, as 1.500 pessoas que sofrem de problemas psíquicos e que nelas vivem e também as 35.000 que recebem serviços gratuitos.
Esta decisão implica:
– Demissões de muitos dos empregadxs nessas instituições e sujeição de outros a ficarem na “reserva”.
– Fusões e fecho de algumas estruturas de saúde mental.
– Regresso dos que sofrem de problemas psíquicos aos manicómios (segundo rumores, isso também significa a reabertura do inferno de Leros).*
De fato, há alguns dias, pessoas que saíram há mais de 20 anos, dos hospitais psiquiátricos (armazéns de almas), tais como o asilo da ilha de Leros, e que desde então têm estado a viver em pensões, albergues e apartamentos dentro das comunidade locais, estão agora a ser forçados a regressar ao ponto de partida da sua difícil viagem: o manicómio.
A ditadura democrática, em 2011, promove o asilo para as xs que sofrem de problemas psíquicos, no mesmo cinismo brutal que abole o asilo universitário.
A política económica do poder transforma-se em biopolítica e mostra a sua verdadeira face: a da política de morte. O Poder discrimina a vida – com base na lógica capitalista da máxima redução dos custos – umas terão valor e outras não, condenando assim milhares de pessoas a “não-vida”. E eis que surge agora, seja através do regresso à alienação total em asilos psiquiátricos, seja através da repressão 24h/24h (tanto na repressão medicamentosa como na repressão “real”: o confinamento dos pacientes difíceis), ou ainda através do seu regresso ao seio da família quando não tantas vezes condenados à exclusão e isolamento sociais – como sem abrigo- e quantas vezes isso não significa uma condenação à morte.
Eles querem atirar-nos para a rua – pois na rua é que vão encontrar-nos!
NÃO À PSIQUIATRIZAÇÂO! NÃO AO REGRESSO A “LEROS”!
LIBERTEM AQUELXS QUE ESTÃO NAS “CELAS BRANCAS”!
* O Asilo de Leros (colónia de doentes mentais) foi criado em 1959, ocupando as instalações militares deixadas na ilha, pelos italianos, na Segunda Guerra Mundial. O objetivo era concentrar todos os pacientes psiquiátricos, de todas as instituições de saúde mental, que fossem considerados incuráveis, a um espaço de confinamento único. O asilo cresceu rapidamente pois todos os pacientes “difíceis” foram enviados para Leros, na década de 1980, assim como quatro mil estágios foram realizadas lá. Prisioneiros políticos também estiveram presos naquele inferno durante a junta militar grega (1967-1974).
As condições horrendas no asilo de Leros retratam o outro lado dos chamados hospitais para doentes mentais. Quase vinte anos após o início da reforma psiquiátrica na Grécia – que nunca foi acabada, na realidade – há agora uma grande ameaça para as pessoas com problemas de saúde mental , o de terem de retornar ao confinamento psiquiátrico, devido a cortes graves no financiamento, em unidades de reabilitação psicossocial, com o Estado a condená-los à extinção.
Leros, a liberdade é terapêutica (2003, subtítulos em inglês)
Documentário de Andreas Loukakos contendo imagens chocantes do asilo psiquiátrico de Leros, fechado há 20 anos. Reveremos estas imagens se não se conseguir impedir a leviandade e o desprezo com que se está a encarar a saúde mental e não só, neste momento.
A Coordenadora dos Trabalhadores na Saúde e Atenção Psicossocial (syntonistiko03sep@gmail.com) faz um apelo para uma greve de 48horas em todas as estruturas de atenção psicossocial para os dias 22-23 de setembro, 2011.
Sem comentários “Grécia: O Estado envia quem sofre de problemas psíquicos para “prisões brancas””