Rede tradutora de contrainformação

[Grécia] Carta aberta de Pola Roupa sobre a sua tentativa de fazer evadir Nikos Maziotis da prisão de Koridallos

chile

A seguir apresenta-se a tradução da primeira parte da longa carta da companheira; publicada originalmente em grego em Atenas IMC (8 de Março de 2016).

Noutras circunstâncias este texto seria escrito em nome da Luta Revolucionária. Todavia, o resultado da tentativa de libertar o companheiro Nikos Maziotis da prisão de Korydallos obriga-me a falar em nome pessoal.

A 21 de Fevereiro [de 2016], num helicóptero, tentei libertar o membro da Luta Revolucionária Nikos Maziotis. A operação foi planeada de forma a que outros presos políticos pudessem se juntar a nós, aqueles que desejassem abrir o seu caminho para a liberdade. Os detalhes do plano – assim como o modo como consegui contornar as medidas de segurança,  abordando armada o helicóptero – não têm nenhum significado especial e a eles não me irei referir; apesar de ter havido muita desinformação relacionada com esses detalhes.

Por uma questão de clareza mencionarei, apenas, que o plano não se baseou em qualquer das fugas anteriores da prisão em helicóptero nem tampouco está associado a quaisquer planos que ainda não tenham sido postos em prática, além de eu não ter qualquer relação com a outra pessoa fugitiva – apesar dos meios de comunicação dizerem o contrário. Além disso, esta tentativa não foi precedida por qualquer plano de fuga que “tenha abortado”, como relatado por alguns meios de comunicação.

Passado um quarto do tempo da viagem – após a descolagem de Thermisia em Argolida – peguei na minha arma e pedi ao piloto para mudar de rumo.  Não entendeu quem eu era, mas ainda assim percebeu que se tratava de uma tentativa de evasão da prisão. Entrou em pânico. Atacou-me, puxando de uma arma – um fato por ele “omitido”. Porque provavelmente vão tentar refutar o facto dele se  encontrar armado, recordo que existem relatórios disponíveis publicamente onde se indica que durante a revista ao helicóptero foram encontradas duas armas. Uma delas era minha, a outra não era. A outra era a sua própria arma, a que lhe caiu das mãos durante a luta em voo. E, quanto a mim, é claro que tinha uma segunda arma. Iria eu, para tal operação, armada apenas com uma?

Perdeu o controle do helicóptero e entrou em pânico gritando “vamos acabar por nos matar”. A descrição que foi apresentada – a de um helicóptero substancialmente incontrolável –  é verdadeira. Mas essas imagens não foram fruto das minhas ações mas sim das suas. O helicóptero foi perdendo altitude e rodopiava no ar. Voamos a poucos metros sobre fios elétricos. Gritei-lhe que puxasse para cima o helicóptero, que fizesse o que lhe pedisse, de forma a que ninguém fosse ferido.

Num instante estávamos em terra.  Em relação aqueles que falam de uma reação desapaixonada do piloto, aparentemente e a julgar pelo resultado, não sei do que possam estar a falar.

Em vez de fazer o que lhe disse para fazer, preferiu correr o risco de sofrermos uma colisão, o que só não aconteceu por acaso. Escusado será dizer que ao entrar no helicóptero – para tentar obter o controle do mesmo e o pôr no rumo das prisões – tinha já tomado a minha decisão. Se ele se recusasse a fazer o que eu dissesse, teria naturalmente de reagir. Aqueles que afirmam que fui a responsável pela descida descontrolada do helicóptero, a 5.000 pés do chão, o que esperavam? Que tivesse dito “se não quiser vir para as prisões, não importa”? Disparei a minha arma e estivemos envolvidos, ambos armados, numa luta corpo a corpo durante o voo.

Preferiu arriscar a chocarmos na montanha, em vez de obedecer. Quando finalmente pousou no chão com velocidade, mesmo sabendo que a operação estava perdida, tive todas as oportunidades de o executar. Conscientemente, decidi não o fazer. Sabendo embora que estava a pôr em perigo a vida ou a liberdade, não o executei – apesar da chance de o fazer. Ele próprio sabe muito bem disso. O único fator que me deteve foi a consciência política. E tomei esta decisão arriscando a minha própria vida e a possibilidade de fugir.

Olhando a operação de fuga da prisão no seu todo, é óbvio que foram tomadas todas as possíveis medidas de segurança para a salvaguardar dos guardas armados que estivessem a patrulhar o perímetro da prisão – levava ainda um colete à prova de balas para o piloto. O objectivo era assegurar que o choque na prisão fosse o de menor risco possível para o helicóptero, companheiros e, é claro, o piloto. Agi com o mesmo pensamento quando desembarcados no terreno; apesar do facto da operação ter falhado por causa do piloto; apesar do fato dele ter estado armado. E, essencialmente, colocar a sua vida acima da minha própria vida e segurança. Mas estou a reconsiderar essa escolha específica.

Organizar para fazer evadir Nikos Maziotis foi uma decisão política, tanto quanto o foi  libertar outros prisioneiros políticos. Não foi uma escolha pessoal. Se quisesse libertar apenas o companheiro Nikos Maziotis não teria fretado um grande helicóptero – um fato que tornou a organização da operação mais complexa. O objetivo da operação era a libertação de outros prisioneiros políticos, também; aqueles que, juntamente connosco, realmente queriam abrir o seu caminho para a liberdade.

Esta ação, portanto, apesar das dimensões pessoais que lhe são conhecidas, não foi uma escolha pessoal, mas uma decisão política. Foi um etapa do caminho da Revolução. O mesmo vale para cada ação que já levei a cabo e para cada ação que farei no futuro. Estes são elos de uma cadeia de planeamento revolucionário destinada a criar condições políticas e sociais mais favoráveis, ampliar e fortalecer a luta revolucionária. A seguir, referir-me-ei à base política desta escolha; mas primeiro tenho que falar sobre fatos e da forma como tenho operado, até agora,em relação a alguns desses fatos.

Como já foi mencionado anteriormente, cada ação que realizo diz respeito a um ato relacionado com a planificação política. No mesmo contexto, expropriei uma filial do banco Piraeus, nas instalações do Hospital Sotiria, em Atenas, em Junho passado [2015]. Com este dinheiro, além da minha sobrevivência na “clandestinidade”, assegurei a organização da minha ação e o financiamento da operação para a libertação de Nikos Maziotis, e de outros presos políticos, das prisões de mulheres de Korydallos. A razão pela qual me refiro a esta expropriação (e não me poderia importar menos com as consequências penais desta admissão) é porque, neste momento, considero que é absolutamente necessário divulgar como operei tendo em conta a segurança dos civis – aqueles que, em determinadas circunstâncias, aconteceu estarem presentes nas ações revolucionárias em que estive envolvida – assim como a minha perspectiva sobre este assunto, sempre mutatis mutandis, na ocasião da tentativa de fuga da prisão.

No caso da expropriação da filial do banco Piraeus, o que mencionei aos funcionários do banco era que não deviam pressionar o botão de alarme, porque isso colocaria em risco a sua própria segurança, já que não estava disposta a deixar o banco sem o dinheiro.  Eu não os ameacei, nem estiveram em perigo por minha causa. Só estariam em perigo por causa da polícia, se os polícias chegassem ao local e, posteriormente, tivesse com eles um confronto armado. E a polícia só chegaria se quaisquer funcionários pressionassem o alarme do banco. Esse era um dos desenvolvimentos que eles mesmos queriam evitar. Porque as pessoas que possam estar presentes em cada ação destas não têm medo daqueles que tentam expropriar, antes sim da polícia intervir. Além disso, é muito estúpido qualquer um tentar defender dinheiro pertencente aos banqueiros. E para que conste, quando um funcionário do sexo feminino me disse “nós mesmos também somos pessoas pobres” sugeri-lhe que passasse por cima de um ponto “cego”, onde as câmaras não nos podem ver, para lhe dar 5.000 euros, o que ela não aceitou, aparentemente por medo. Se ela tivesse aceite o dinheiro, podia ter a certeza de que eu não iria falar publicamente do assunto. E um detalhe: o que estava a segurar era um avental de médico para esconder a minha arma enquanto esperava fora do banco; não foi uma toalha (!), conforme mencionado várias vezes.

Em cada período de tempo, na luta pela Revolução – como também no caso de todas as guerras – às vezes xs revolucionárixs são obrigadxs a procurar a ajuda de civis, na sua luta. Os exemplos históricos são muitos – uma tentativa de documentá-los iria encher um livro inteiro e este não é o momento para expandir sobre o assunto – tanto na Grécia como em movimentos armados e organizações noutros países. Nesses casos, no entanto, o que essencialmente lhes pedimos é para tomarem partido numa guerra. Uma vez que alguém se recusa a ajudar, a sua posição não é apenas sobre a prática em particular, mas uma postura hostil, em geral, contra a luta. Põem em perigo ou anulam compromissos, colocam as vidas dxs combatentes em risco, jogam obstáculos no caminho de um processo revolucionário. Tomam uma posição contra a guerra social e de classe.

Nem na filial do banco Piraeus ou durante a tentativa de fuga de helicóptero tornei a minha identidade conhecida. Portanto, nenhum dos envolvidos nestes casos sabia que aquelas eram ações políticas. Mas, depois da tentativa de fuga ter falhado, e dado que – como já mencionei – tive a oportunidade de matar o piloto mas não o fiz, arriscando a minha própria vida, tenho que tornar o seguinte público: a partir de agora – sempre que precisar da assistência de civis novamente e se o considerar necessário – vou tornar a minha identidade conhecida desde o início. Dado que a minha missão, em qualquer caso, diz respeito à promoção da luta pela derrocada do sistema criminal, que todos saibam que qualquer eventual recusa de cooperação ou esforço para obstruir a ação serão tratados em conformidade.

Estou, naturalmente, ciente dos detalhes pessoais do piloto, mas não vou ameaçar a sua família. Nunca iria ameaçar as famílias e crianças.

Este é o meu balanço após a tentativa de fuga e que devia ser tornado público.

A OPERAÇÃO DE ESCAPE DA PRISÃO FOI UMA ESCOLHA REVOLUCIONÁRIA

[…]

O ESCAPE DA PRISÃO FOI TENTADO PELA REVOLUÇÃO SOCIAL

LUTEI TODA A VIDA PELA REVOLUÇÃO SOCIAL

VOU CONTINUAR A LUTAR PELA REVOLUÇÃO SOCIAL

Pola Roupa
membro da Luta Revolucionária

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